O Pornographo - um blog que não sai do corpo (fund. 2005)
[123] A melhor homenagem
Conversa ouvida, digo, escutada, hoje, nos gabinetes higiénicos femininos lá do escritório:
Dona J. (cerca de 58 anos e 4 meses): "Então o Cesariny lá morreu...?"
Dona B. (entre os 30 e os 60 anos): "Pois foi, coitado, mas também já era tão velhinho...".
Dona J.: "Eu gostava muito dele. Antes nem o conhecia, mas aqui há uns 6 anos, o meu homem andava num alfarrabista à procura de revistas e livros picantes - nota, não é que ele precise, mas a gente diverte-se - e encontrou um livrinho embrulhado num plástico que dizia, escrito à mão: "Virgem Negra". Ele pensou que era com mulatinhas, sabe que eu até nem desgosto e comprou. Vai-se a ver, chega a casa, desembrulha o pacote... e era um livro do Cesariny.
O Virgem Negra. Ficámos um bocado desanimados, mas assim como assim, estávamos já na cama, abriu o livro numa página ao calhas. E começou a ler: "Vem, vulva antiquíssima e idêntica...". Olha, eu achei aquilo uma maneira tão romântica e excitante de me chamar para a coisa.... Fiquei logo encalorada. Agora já é um código: cada vez que quer brincadeira, recita.
Fez-nos muito bem, o Cesariny. Hoje estamos quase bielo-cosidos".
[122] Cultura, erudição e a "Pluma" da Galp
Muitos perguntam-me se O Pornographo é um blog erudito ou "apenas" culto. A esses digo: partis de uma redução inadequada, apenas cómoda para as vossas mentes estreitas. O Pornographo é um blog pornographico.
Alguém respeitado disse que a cultura é o que fica quando nos esquecemos de tudo do que aprendemos (ou assim). Ainda é, portanto,
informação, posto que sublimada.
Já a erudição é uma
atitude, que se caracteriza principalmente por um majestático caganço em cima da cultura, retratada na perfeição por Achille Talon.
Ora O Pornographo não é um blog culto, nem erudito, nem qualquer coisa de intermédio. É um terceiro género, que
poucos têm a felicidade de comprender como tal (a quem arremesso desde já, vexado, braçadas de confusos agradecimentos).
Peguemos, por assim dizer, na "Pluma" da Galp.
Perante esse anúncio, o culto exibirá: "Eis uma reencarnação da Lana Turner. Tudo foi sempre uma questão de calções: varia só a tez das 'hastes que se irrequietam abaixo do algodão' ", e citará a propósito um poeta contemporâneo qualquer (de preferência americano).
O erudito, por seu lado, ruminará: "A
potência das pernas longas, associada ao gás,
replica Hermes, e transforma as trocas económicas num exercício de comunicação, onde se espelham simultaneamente o
desejo e a sua
impossibilidade, corporizada no
desequilíbrio do olhar e no
desacerto da penetração de quem empunha o martelo-pilão. Numa palavra, representa-se a
distância que só se cava na
presença (numa forma de presença: o contacto visual, e por isso há aqui algo de "espectral", no sentido de Derrida), porque a
ausência remete para a ininterrupção dos trabalhos masculinos, onde a distribuição pernilonga do gás é, por natureza, inimaginável" (assim mesmo, pleno de itálicos incompreensíveis, destinados à titilação da criatividade do leitor).
Pois bem: nada disto vos direi. Após estudo aprofundado do anúncio, O Pornographo, circunspecto, suspeita que a menina da Pluma beneficia de externalidades quando vai à esteticista: a depilação das virilhas é bem capaz de se confundir com a dos sovacos.
[121] Criações de joalharia (edição limitada)
Como sabeis, o espírito pornographico é longitudinal ao mundo e transversal à matéria. Tudo abarca (como predisposição cognitiva), tudo interpreta (mediação hermenêutica), tudo transforma (vocação demiúrgica).
Só para vos dar um exemplo, que às vezes isto fica um bocadito abstracto:
Ontem terminei o esboço da primeira jóia de O Pornographo, que procurarei vender ao fabricante que o queira. Trata-se de um alfinete de peito, desenhado num motivo elegantíssimo, com inspiração arte nova, assim folhagens longas, hastes, sugestões de saxofones e Panhards, feito em prata e granadas a condizer.
A originalidade são duas: da nervura que remata o extremo inferior, pende um finíssimo fio de prata, de cerca de 5 cms., com três pequenas pérolas muito brancas, espaçadas. E por baixo da nervura, em jeito de divisa, uma frase escrita em prata trabalhada: "Isto não foi um broche".
[120] À atenção do Cavaleiro Piotr Kropotkine
Aproxima-se a passos largos aquela que já é
a intervenção cirúrgica mais participada de toda a blogosfera. Tenho seguido o processo com um olhar reservado, porém atento. E, mais do que desejar boa sorte ao nosso valoroso
Piotr, conto-lhe uma piquena história para reflexão.
Há uns anos atrás, estava eu nas minhas investigações, fui acometido por uma forte dor no ventre, assim sobre o lado direito quem vai para a virilha.
Hospital e tal, maaaaas eu já imaginava para o que ia e preparei-me. Apendicite, uma situação perfeitamente normal, bloco operatório, e quando me tiram a bata, surge a t-shirt que tinha pintado com as minhas próprias mãos: "Mexei nisto como se fossem os guizos do vosso filho".
O pessoal ficou logo bem disposto, e assim, porreirinho, correu tudo bem, a costura mal se nota, enfermeiras muito atenciosas no pós-operatório.
É que, nestas coisas, também temos de nos pôr no lugar deles, coitados.