[51] Querido Pai Natal:
Sei, melhor do que muitos, o que a crise representa para as famílias: um dos primeiros sinais é a quebra nas vendas de
lingerie.
Sei que a crise atinge sobretudo os mais necessitados como tu, que andas todos os dias de todos os anos com a mesma roupinha encardida.
Sei também que ninguém te paga
royalties pelas cuequinhas vermelhas com pompom branco que surgem anualmente, por esta altura, nos nossos catálogos. Nem pelos
soutiens com leves barbas brancas a pender das barbas de baleia.
Mas se quisermos manter vivo o espírito de Natal, temos que partilhar. Por isso, em não te fazendo muita falta, podes deixar-me no sapatinho uma rena (deixo a porta da varanda aberta para não a sujares toda com a fuligem da chaminé; não tenho banheira, apenas um modesto polyban). Pelo andar da carruagem, dará muito jeito no fim de ano.
Se te fizer muita falta, deixa-ma só na manhã do dia 25, por empréstimo, e eu devolvo-ta no dia 24 de Dezembro do próximo ano, a tempo de cumprires os teus deveres. Por essa altura, já terei terminado a minha pesquisa. Não estrago.