[118] Criptolhões
Todas os dias, ao longo do ano inteiro, procuro interpretar as mensagens que o calendário digital da parede do escritório me tenta fazer chegar.
Ontem, por exemplo: SEX 20 OUT. Pareceu-me que havia bons indícios de uma orgia ao ar livre. No fim da noite percebi que significava apenas: seduzir uma moçoila de 20 anos está completamente fora de questão.
Novembro, que aí vem, também traz muita esperança. Quando chegar a SEX 03 NOV, acreditarei que foram admitidas 3 noviças no convento onde dou assistência técnica. Sempre esperando que não suceda algo de semelhante ao ano passado, naquela célebre QUI 27 NOV: em vez da ansiada quibanda de 27 noviças, tudo se resumiu a provar um Quinta do Noval 1927, com
grissini rançosos, em casa do meu vizinho gágá, celibatário e incontinente.
Todos os dias e meses têm suas promessas e decepções. Lembro particularmente aquela vez em que o calendário avariou e, quando cheguei ao escritório na segunda feira, ainda mostrava DOM 24 JUL. Vi ali, imediatamente, um conselho para procurar uma
domina na 24 de Julho. Engano total e absoluto: à sua maneira, o calendário queria apenas avisar-me de que a chata do nº 24 viria oferecer-me uma das suas insuportáveis e fedorentas julianas de legumes.
Ou então a terrível premonição da SEG 02 FEV, onde li uma indicação nítida para segurar, com minhas próprias mãos, as duas fêveras imensas que a Natalina da cantina ostenta no fundo das costas. Para além de encaixar um bofetão ribombante, ainda tive que recusar o convite do meu canalizador para participar, nesse mesmo dia, numa matança do porco.
Mas enfim, como dizia Sebastião da Gama,
é pelo sonho que vamos, e espero que no próximo ano ocorra a cifra mágica: SEX 01 ABR.